As contradições da conversão de Paulo: Os companheiros ouviram ou não a voz de Jesus?

Postado por Presbítero André Sanchez, em #VocêPergunta |

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Você Pergunta: Existe uma possível contradição na Bíblia que me incomoda um pouco: Ela está descrita em Atos dos Apóstolos 9:7, que diz que os companheiros de Paulo ouviram a voz e não viram ninguém. Já em Atos dos Apóstolos 22:9, diz que viram a luz e não perceberam o sentido da voz. Esses textos não estão em contradição?

Caro leitor, para compreendermos melhor essa história, temos de construir precisamente o contexto de cada uma das citações feitas no livro de Atos a respeito da conversão do apóstolo Paulo e depois juntá-las. Comecemos com a narrativa de Lucas, que é feita em terceira pessoa em Atos 9:7.

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As contradições na conversão de Paulo

(1) Vamos nos concentrar inicialmente apenas no momento em que houve o encontro do apóstolo Paulo com o Senhor Jesus, que é o foco da nossa análise.

Observe que Lucas tem como foco principal narrar a experiência do apóstolo Paulo, citando de forma precisa o que aconteceu com o apóstolo, inicialmente:

“Seguindo ele estrada fora, ao aproximar-se de Damasco, subitamente uma luz do céu brilhou ao seu redor” (Atos 9:3).

Observamos que a luz extremamente brilhante atingiu Paulo em cheio. Aqui, Lucas não se preocupa em falar dos companheiros de viagem, pois está focado em apresentar o que ocorreu com o apóstolo. Esse brilho extremo fez com que o apóstolo caísse ao chão:

“e, caindo por terra, ouviu uma voz que lhe dizia: Saulo, Saulo, por que me persegues?” (Atos 9:4).

Lucas ainda adiciona rapidamente um comentário do que aconteceu com os companheiros de viagem de Paulo: “Os seus companheiros de viagem pararam emudecidos, ouvindo a voz, não vendo, contudo, ninguém” (Atos 9:7).

(2) A segunda narrativa mostra Lucas descrevendo as próprias palavras de Paulo, falando ali em primeira pessoa, pregando para a multidão furiosa, escoltado por soldados.

Paulo também menciona aqui a luz que brilhou ao redor dele: “Ora, aconteceu que, indo de caminho e já perto de Damasco, quase ao meio-dia, repentinamente, grande luz do céu brilhou ao redor de mim” (Atos 22:6).

Ele explica que ouviu a voz de Jesus, chamando-o pelo nome e questionando a perseguição que ele realizava: “Então, caí por terra, ouvindo uma voz que me dizia: Saulo, Saulo, por que me persegues?” (Atos 22:7).

Agora entra o ponto “discordante”, quando ele narra sobre os companheiros de viagem: “Os que estavam comigo viram a luz, sem, contudo, perceberem o sentido da voz de quem falava comigo” (Atos 22:9).

(3) Temos ainda uma terceira narrativa que menciona o que ocorreu na conversão de Paulo. A mesma luz que brilha ao redor de Paulo é citada aqui:

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“Ao meio-dia, ó rei, indo eu caminho fora, vi uma luz no céu, mais resplandecente que o sol, que brilhou ao redor de mim e dos que iam comigo” (Atos 26:13).

Observe que aqui, Paulo destaca que ele ouviu o que a voz falava (teve compreensão) e não fala nada sobre os companheiros, porém, revela que todos caíram por terra quando a luz brilhou sobre a caravana:

“E, caindo todos nós por terra, ouvi uma voz que me falava em língua hebraica: Saulo, Saulo, por que me persegues? Dura coisa é recalcitrares contra os aguilhões” (Atos 26:14).

Com todas essas informações, agora estamos preparados para esclarecer que não temos nenhuma contradição no texto bíblico. Vejamos:

(4) É importante entendermos que as narrativas mostram que a revelação detalhada de 100% do que ocorreu foi dada somente a Paulo. As três narrativas apontam isso. Paulo viu a luz, caiu, foi questionado por Jesus e dialogou com Ele, que o respondeu.

Mas e os companheiros de viagem? Eles tiveram participação, porém, não em tudo que ocorreu. Eles conseguiram perceber que o que aconteceu ali foi incomum, mas não todos os detalhes do acontecido.

Uma primeira interpretação da conta que possivelmente a voz que os companheiros de Paulo ouviram em Atos 9:7 era a voz do próprio Paulo. A cena que se desenha ali é Paulo conversando com alguém que os companheiros de viagem não viam. Uma cena estranha, não é mesmo? Eles viram a luz, pois ela os fez cair, como explica Atos 26:13-14 e viram Paulo falando com algo invisível.

Porém, muitos teólogos questionam essa possibilidade, dizendo que se fosse a voz de Paulo, certamente haveria uma diferenciação dentro da cena, para não haver confusão com a voz de Jesus.

Uma outra explicação interessante é que os companheiros de Paulo ouviram a voz, porém, mais como um tipo de barulho ininteligível para eles, ou seja, não conseguiam interpretar o que estava sendo falado em detalhes. Esse parece ser o sentido de “sem, contudo, perceberem o sentido da voz de quem falava comigo” (Atos 22:9).

Se essa interpretação estiver certa, então, os companheiros de viagem participaram de toda a cena, exceto ver Jesus de forma precisa e ouvir exatamente o que Jesus estava falando. Eles viram apenas o suficiente para perceberem algo que não era natural acontecendo.

(5) Conforme podemos perceber, as narrativas se complementam, buscando trazer detalhes, sob a ótica de cada momento em que elas vieram à tona, chamando os leitores a entender a grandeza do chamado de Paulo, vindo do próprio Cristo e testemunhado parcialmente no que diz respeito aos detalhes, por aqueles que viajavam junto com o apóstolo.

Assim, podemos resumir da seguinte forma:

“Os seus companheiros de viagem pararam emudecidos, ouvindo a voz, não vendo, contudo, ninguém” (Atos 9:7).